2004-03-07
Ela é assim, o cão não e eu não sei
- Olha-me nos meus olhos – pediu-me – e diz-me o que vês.
Obedeci, apesar de os meus olhos se sentirem tentados a percorrerem todo o seu corpo, as curvas subtis, os tornozelos a saltarem para fora de umas calças justas e pretas. Os olhos tinham uma pergunta por fazer. Eu não sabia qual era. Eu não podia saber qual era.
O olhar dela era firme mas terno.
O meu olhar pousara ali, ao de leve, pensando em qual a resposta certa para que aqueles olhos me sorrissem. Apenas via o castanho e uns pequenos pontos brilhantes na íris, ligeiramente mais claros. Dizer o que vejo... como posso eu dizer o que vejo quando apenas me apetece dizer o que sinto. Um desejo de percorrer este corpo com o meu olhar, de desnudar um ombro, de aflorar a pele macia que se adivinha nos tornozelos que espreitam, de entrelaçar os dedos compridos de pianista com que afagas o teu cabelo.
As palavras recusam-se a sair da minha boca, e quando estou quase, finalmente, a abrir a boca, pousas um dedo nos meus lábios e sussurras: O teu tempo de antena acabou...
Aturdido deixo-me estar ali, espraiado no arraiolos que cobre o chão da tua sala. Levantas-te da almofada e segues para o quarto com plena certeza que o meu olhar te acompanha e que é natural que se demore um pouco mais na curva que medeia entre as costas e as pernas.
Fico sem saber o que fazer. Sigo-te ? Espero por ti ? Chamo-te ? O meu tempo de antena acabou, quer isso dizer que me devo levantar, alçar a perna sobre o cão que dorme sob a ombreira da porta e sair ?
Mais uma vez a minha inacção volta-se contra mim. Entras na sala como se eu não estivesse lá e começas a arrumar o piquenique que fizemos no chão.
Levanto-me, pego num copo ao acaso e sigo-te para a cozinha. E é defronte da bancada que te voltas para mim e me perguntas - Com que então os meus olhos não te dizem nada ?
- Claro que sim – respondo a custo – mas é-me difícil falar-te do que eles me dizem. Porque... – a minha voz morre fininha como um fio de água a extinguir-se.
Soltas uma gargalhada e voltas-me de novo as costas. Sigo-te. Entramos os dois na sala e voltas a sentar-te numa das enormes almofadas que polvilham o chão. Escolho outra, perto, bem perto. Estendo uma mão que toca na tua, pretensamente numa carícia que evitas retirando a tua mão. Estás com a boca fechada e séria mas os teus olhos riem-se maliciosamente.
- Os teus olhos dizem-me que estás a gozar comigo.
Ri-se, e duas covinhas aparecem-lhe na cara – E os teus olhos dizem-me que me queres comer, mas não sabes como.
Mais uma vez esta mulher me deixa parado, sem saber que fazer, que dizer ou como actuar. Sorrio apenas com esperança que esse sorriso traduza uma confiança que não sinto.
Ela espreguiça-se com volúpia, olha para o relógio e diz que tem de ir trabalhar, levanta-se apressada e diz-me adeus da porta. Quando saíres fecha a porta por favor.
O cão levanta por fim as orelhas e vem-me dar uma lambidela de compreensão antes de se deitar na almofada anteriormente ocupada por ela. Abraço-o e penso como os cães são meigos e fáceis de entender.
- Olha-me nos meus olhos – pediu-me – e diz-me o que vês.
Obedeci, apesar de os meus olhos se sentirem tentados a percorrerem todo o seu corpo, as curvas subtis, os tornozelos a saltarem para fora de umas calças justas e pretas. Os olhos tinham uma pergunta por fazer. Eu não sabia qual era. Eu não podia saber qual era.
O olhar dela era firme mas terno.
O meu olhar pousara ali, ao de leve, pensando em qual a resposta certa para que aqueles olhos me sorrissem. Apenas via o castanho e uns pequenos pontos brilhantes na íris, ligeiramente mais claros. Dizer o que vejo... como posso eu dizer o que vejo quando apenas me apetece dizer o que sinto. Um desejo de percorrer este corpo com o meu olhar, de desnudar um ombro, de aflorar a pele macia que se adivinha nos tornozelos que espreitam, de entrelaçar os dedos compridos de pianista com que afagas o teu cabelo.
As palavras recusam-se a sair da minha boca, e quando estou quase, finalmente, a abrir a boca, pousas um dedo nos meus lábios e sussurras: O teu tempo de antena acabou...
Aturdido deixo-me estar ali, espraiado no arraiolos que cobre o chão da tua sala. Levantas-te da almofada e segues para o quarto com plena certeza que o meu olhar te acompanha e que é natural que se demore um pouco mais na curva que medeia entre as costas e as pernas.
Fico sem saber o que fazer. Sigo-te ? Espero por ti ? Chamo-te ? O meu tempo de antena acabou, quer isso dizer que me devo levantar, alçar a perna sobre o cão que dorme sob a ombreira da porta e sair ?
Mais uma vez a minha inacção volta-se contra mim. Entras na sala como se eu não estivesse lá e começas a arrumar o piquenique que fizemos no chão.
Levanto-me, pego num copo ao acaso e sigo-te para a cozinha. E é defronte da bancada que te voltas para mim e me perguntas - Com que então os meus olhos não te dizem nada ?
- Claro que sim – respondo a custo – mas é-me difícil falar-te do que eles me dizem. Porque... – a minha voz morre fininha como um fio de água a extinguir-se.
Soltas uma gargalhada e voltas-me de novo as costas. Sigo-te. Entramos os dois na sala e voltas a sentar-te numa das enormes almofadas que polvilham o chão. Escolho outra, perto, bem perto. Estendo uma mão que toca na tua, pretensamente numa carícia que evitas retirando a tua mão. Estás com a boca fechada e séria mas os teus olhos riem-se maliciosamente.
- Os teus olhos dizem-me que estás a gozar comigo.
Ri-se, e duas covinhas aparecem-lhe na cara – E os teus olhos dizem-me que me queres comer, mas não sabes como.
Mais uma vez esta mulher me deixa parado, sem saber que fazer, que dizer ou como actuar. Sorrio apenas com esperança que esse sorriso traduza uma confiança que não sinto.
Ela espreguiça-se com volúpia, olha para o relógio e diz que tem de ir trabalhar, levanta-se apressada e diz-me adeus da porta. Quando saíres fecha a porta por favor.
O cão levanta por fim as orelhas e vem-me dar uma lambidela de compreensão antes de se deitar na almofada anteriormente ocupada por ela. Abraço-o e penso como os cães são meigos e fáceis de entender.