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2004-02-29

 
Coincidência ou precaução ?

No IC19 foi finalmente colocada a nova ponte pedonal que substituirá a que ruiu em Setembro passado. Ponte essa que desabou após uma acção de conservação, por isso uma dúvida paira no meu espiríto: o simulacro de acidente realizado de seguida no IC19 foi mera coincidência ou foi uma forma encapotada de vedar a circulação e por no local perto de 300 bombeiros ?


Foto Andre Kosters/Lusa

 
*LUA ADVERSA*

Tenho fases, como a lua
Fases de andar escondida,
Fases de vir para a rua...
Perdição da minha vida!
Perdição da vida minha!
Tenho fases de ser tua,
Tenho outras de ser sozinha.

Fases que vão e vêm,
No secreto calendário
Que um astrólogo arbitrário
Inventou para meu uso.

E roda a melancolia
Seu interminável fuso!
Não me encontro com ninguém
( tenho fases, como a lua...)
No dia de alguém ser meu
Não é dia de eu ser sua...
E, quando chega esse dia,
O outro desaparece...

( Cecília Meireles)


 
O lançamento da antologia poética Na voragem dos dias ocorreu ontem, em Lisboa, no auditório da Biblioteca Municipal Orlando Ribeiro.


Após a apresentação do livro efectuada por dois dos seus coordenadores, Aida Fazendeiro e Manuel Neves e por um dos elementos do juri de selecção - João Paulo Sousa. Foram lidos 40 poemas de outros tantos autores por Helena Afonso e Ricardo Simões da Oficinactores enquanto um conjunto de slides, em jeito de pano de fundo, ilustravam a obra.


Depois foi a vez da brilhante actuação de elementos da escola de Jazz do Seixal fecharem esta autêntica festa da poesia que contou com a presença de muitos dos co-autores deste projecto bem como de numerosa assistência.


Foi asssim que aquilo que era um sonho para muitos dos autores se tornou realidade, verem as suas palavras, saltarem dos papeis guardados nas gavetas e do écran para letra impressa.

O livro seguirá agora o seu caminho.



P.S. A reportagem fotográfica será publicada assim que possível, bem como informações sobre sessões de apresentação do livro que ocorrerão um pouco por todo o país.

2004-02-28

 
A maldição dos escritores

A maioria dos que como nós estão suficientemente pirados para só se dedicarem À literatura, não a diluindo com o jornalismo e outros dissolventes, termina sssim: sentimos com o objectivo de escrever. Vais ver, vais notar que não só a líbido se oxidou, como em breve te surpreenderás quando deres por ti a registar mentalmente todos os teus sentimentos como se fosses um reles contabilista. O amor, o ódio, para não falar dos teus orgasmos, e até o terror, vais classificar tudo convenientemente para depois o plasmar em advérbios e adjectivos dentro de uma história. É uma maldição conhecida.

in "Nada é o que parece" de Carmen Posadas


2004-02-27

 



Gothika

Do mesmo realizador dos Crimes do Rio Púrpura, Mathieu Kassovitz , chega-nos Gothika.
Miranda uma eficiente psiquiatra, vê-se repentinamente enclausurada no hospital psiquiátrico em que trabalha, acusada da morte violenta do seu marido. Miranda de nada se lembra, apenas de uma jovem na estrada, e a partir daqui as recordações não serão melhores. Um filme que aborda um tema sobrenatural, fantástico, do além...Para quem goste do género recomenda-se.

 



Desaparecidas

Um filme que tenta reacender a magia dos westerns, com índios e muita mística. Além disso pouco mais nos trás...Cate Blanchett é Maggie uma curandeira que tenta criar as duas filhas o melhor possível. Tommy Lee Jones, é o pai desnaturado de Maggie, que regressa em busca da família que abandonou há anos. Após este reencontro, Lily, filha de Maggie, é vítima de sequestro por um grupo de índios dissidentes, pelo que pai e filha têm de se unir para a resgatar.

2004-02-26

 
Sob Escuta



È agradável, é bom, é relaxante...no mesmo estilo do anterior recomenda-se.

 
O RISO E O BOM - HUMOR
Numa entrevista ao Notícias Magazine ,de domingo passado, a psicóloga Isabel Empis explica que o sentido de humor é estruturante da personalidade e pode até salvar-nos a vida. A propósito de possíveis receitas para o estado de depressão colectiva afirma que " A receita é o trabalho interior, exercitar a tolerância, amar a diferença, enriquecer-se com o diferente, e sobretudo, mas sobretudo abandonar o julgamento. É um peso horrível a pessoa ter de julgar o próximo. "

 



Já aqui falamos do lançamento deste livro que conta com poemas de três faroleiros, Cristina Augusto, Paula dos Santos e Pedro Farinha entre 40 poetas seleccionados.

O que talvez ainda não tenha dito é que este livro é uma evolução de um projecto iniciado pela comunidade virtual Sonhos de poeta que já editou o livro Poesi@, livro esse que esgotou rapidamente e onde foi possível publicarem pela primeira vez um conjunto de autores que apenas tinha divulgado o seu trabalho pela internet.

Nesta segunda antologia, Na voragem dos dias, o processo de selecção de autores ficou a cargo do Dr. José Paulo Sousa (Biblioteca-Museu República e Resistência), Drª Maria da Conceição Teixeira (Prof. de Portugês e Lit. Portuguesa na Escola Sec. Francisco Simões) e de Drª. Teresa Sampaio (Pelouro da Cultura da Câmara Municipal de Lisboa) e julga-se ter-se atingido um novo patamar em termos qualitativos.


Enquanto não podemos escrever o percurso deste livro, apenas o tempo o dirá, pode-se recordar o que foi o Poesi@, nas palavras de Aida Fazendeiro:

O projecto de publicação de um livro , que juntasse autores do canal sonhos_de_poeta e frequentadores da página da comunidade, foi concluído com sucesso.

Como qualquer projecto dinâmico e ousado sofreu, ao longo da sua realização, inúmeras alterações, com que se fez o contraponto entre o sonhado e a realidade possível.

O livro que hoje temos na mão é um livro construído de coragem, na difícil gestão de muitos quereres e de muitos inesperados. É uma aventura a que chamámos Poesi@, palavra de título que reflecte o nosso comum amor pela palavra desafio.

O lançamento em 14 de Dezembro de 2002 , no Bar Ar-de-Rio, no Porto, juntou muitos dos autores, amigos, familiares e amantes de poesia, numa alegre confraternização, em que à palavra poética se juntou o jazz, na voz bonita de Kátia Leonardo.

O que ali se passou veio a ser confirmado pela procura dos livros e pelas apresentações que se seguiram.

Em Ponta Delgada, nos Açores, o livro foi dado a conhecer no dia 6 de Janeiro de 2003, na Livraria Artes e Letras, por iniciativa de Eugénia Vieira e Carolina Viveiros, com largo apoio local, nomeadamente dos media. Curiosamente, a distância física que nos separa, foi mais uma vez ultrapassada pela net, por uma ligação directa com o canal #sonhos_de_poeta.


No passado Sábado, 11 de Janeiro de 2003, em Lisboa, realizou-se, também uma apresentação do livro, na Biblioteca-Museu República e Resistência, pelas 17 horas.

A apresentação esteve a cargo de Pedro Farinha, que soube de forma sóbria e despretensiosa, mas muito correcta e rica, apresentar a antologia e o modo como um sonhador, Manuel Neves, conseguiu congregar vontades e sonhos e concretizar este projecto que cremos inovador inédito.

Uma selecção de poemas foi dita pelas vozes de José Paulo Sousa e Margarida Narciso.

Viva foi a presença de todos os autores, cujos poemas foram representados na projecção de uma bela colecção de slides elaborada por Pedro Farinha.

Colaborou na sessão o grupo Zurrapa.

Formado por três talentosos jovens, o grupo recriou, à sua maneira, num registo vanguardista de qualidade, a "alma" da poesi@. Os sons criaram tensões à volta da palavra, morderam-na, saborearam-na, reinventaram-na, desnudaram-na, vestiram-na de gestos e movimentos. Viveram-na.

Seguiu-se uma sessão de autógrafos e confraternização.

A aceitação do livro foi óptima, em Lisboa, como em todos os outros locais do país onde foi difundido, encontrando-se praticamente, esgotada a edição. De momento apenas restam alguns exemplares nos pontos de venda, o que, evidentemente , muito nos alegra.

Termino esta minha reflexão sem que me apeteça colocar um ponto final parágrafo. Sei que para alguns este será apenas o início da aventura. Se não lhes faltar a força, a coragem, a humildade e o trabalho , talento também não lhes faltará. Realmente não me apetece usar o ponto final, preferia partilhar as reticências, preferia partilhar as dúvidas, preferia partilhar o sonho e a esperança, porque…


"O que é bonito neste mundo, e anima,
É ver que na vindima
De cada sonho
Fica a cepa a sonhar outra aventura…"


Miguel Torga, in Cântico do Homem

Como se viu, uma nova aventura teve agora inicío...



 


José Luís Peixoto no 6º aniversário da FNAC

Sábado, dia 28 de Fevereiro, a FNAC comemora o seu 6º aniversário em Portugal. Quem se dirigir à FNAC Colombo poderá receber como oferta comemorativa um conto inédito de José Luís Peixoto - A idade das Mãos.

 
5ª Temática

Hoje é Quinta-Feira mas não há 5ª Temática. No entanto, em principío, esta rúbrica volta ao Farol na próxima 5ª feira.

2004-02-24

 
O GATO



Um gato, em casa, sózinho, sobe
à janela para que, da rua, o
vejam.

O sol bate nos vidros e
aquece o gato que, imóvel,
parece um objecto.

Fica assim para que o
invejem - indiferente
mesmo que o chamem.

Por não sei que privilégio,
os gatos conhecem
a eternidade.


OS GATOS

Em madrid, os gatos
escondem-se nos muros;
e a hera tapa-lhes
os dorsos
como se fossem reis!


OUTRO GATO

Um gato, numa casa velha, toma
posse de tudo. São dele os sofás esburacados,
as camas por fazer, os armários de portas
abertas. Sobe para cima das cadeiras e,
como um deus, olha os seus domínios
sem compaixão nem medo.

Porém, se o surpreendemos
na sua pose, inquieta-se. Arqueia o dorso,
olha-nos com ar de desafio, e só
se alguém se aproxima é que
salta, dando início à fuga por entre salas
e corredores.

Por fim, talvez o encontremos a espreitar
de um telhado; ou a sua presença furtiva se
sinta, à noite, quando nos apercebemos
do bater de uma janela mal fechada,
ou damos por que o vento empurrou a porta
do quintal.

Nuno Júdice

Estes poemas forma gentilmente enviados para a Mafalda pelo Rui Lima. Miaugado para ele.

 
Apartamentos



Estão disponíveis T0 apenas pela módica quantia de um miau. Inclui agua, leite e ração. Se é gato/gata não perca esta excelente oportunidade, no Condomínio do F & F.

 
O Homem da conspiração

Nuno Markl garante que as coincidências, as concomitâncias acidentais de dois ou mais fenómenos, existem, contrariando uma das frases-chave da prolífica Margarida Rebelo Pinto. Ele, Markl, pretende explicar por A + B que se por um lado dois e dois fazem quatro, por outro podem perfazer vinte e dois. O ficcionado Homem da Conspiração pega em notícias publicadas, indesmentíveis, datadas, e, partindo da paráfrase, dá origem a analogias, a anedóticas analogias. Este programa de cinco minutos, mostrado de Segunda a Sexta às 23.00 e 01.15 horas na SIC Radical, está incluído noutro programa do canal, que junta Nuno Markl a Fernando Alvim, «O Perfeito Anormal».

E se este é o Shampoo o outro é o amaciador, numa espécie de 2 em 1 vendido a preços concorrenciais. Engenhoso, mirabolante, feliz, O Homem da Conspiração é também exibido em versão de compacto semanal à meia-noite de Domingo.

SicRadical

2004-02-23

 



já não é hoje?
não é aquioje?


já foi ontem
será amanhã?


já quandonde foi?
quandonde será?


eu queria um jàzinho que fosse
aquijá
tuoje aquijá.


Alexandre O’Neill

2004-02-20

 
A Gata Mafalda



Miau Paula, um tema sobre nós e tu ainda não fizeste um post???
Miau, miau, miau!!! Vou falar com o Pinóquio e a Fofinha!

 
"Ainda pior que a convicção do não, é a incerteza do talvez, é a desilusão de um quase!
É o quase que me incomoda, que me entristece, que me mata trazendo tudo que poderia ter sido e não foi."
- Fernando Veríssimo

2004-02-19

 


Apresento-vos a minha gata - a Lady.

Por vezes salta para cima do computador atenta ao movimento ágil dos meus dedos e põe-se em posição expectante. Porque será que o meu dono esboça um sorriso ou o que provocará tamanha agitação no seu semblante ?

Outras vezes ronrona no meu colo ou deita-se simplesmente a dormir, cauda virada para mim, num desprezo absoluto pela minha habitual perda de algumas horas de sono frente ao écran.

É assim a Lady, a minha gata... claro que existe uma outra gata na minha vida, mas essa não é chamada aqui para os posts.

 
Curiosidades sobre gatos


· A região do cérebro responsável pelas emoções é igual nos homens e nos gatos.

· O cérebro do homem é muito mais parecido com o do gato do que com o do cão.

· Os gatos têm especial preferência por nomes terminados no som “i”.

· Os bigodes do gato servem para ele medir as distâncias e são um total de 24, agrupados de 4 em 4.

· A audição dos gatos é muito mais sensível do que a nossa porque os seus ouvidos afunilados servem como que de megafone que canaliza e amplifica os sons. Assim, os gatos conseguem ouvir até 65 khz (kilohertz), e os homens apenas até 20 khz.

· Só com cerca de duas semanas de vida é que os gatos já ouvem bem e os seus olhos abrem por volta do sétimo dia.

· Enquanto o Homem possui cerca de 5 a 20 milhões de células olfactivas, os gatos possuem cerca de 60 a 80 milhões! Além destas células existe um outro orgão que serve a mesma função olfactiva e que está situado no céu da boca, que é o orgão de Jacobson. É um analisador de odores que é activado quando o gato sente odores fortes.

· Já alguma vez viu um gato a cheirar um flor? De facto, eles gostam muito de cheiros de loções e perfumes e tentam não perder uma oportunidade para sentir tais aromas!

· Enquanto o homem possui 206 ossos os gatos possuem 245.

· Os gatos possuem mais 5 vértebras que os humanos; são 30 no seu total.

· O gato usa a cauda para se equilibrar.

· Cerca de 10% dos ossos do gatos está situada na cauda, de tal modo que o equilíbrio seja assegurado.

· A cauda é um termómetro do estado de humor do gato. E a propósito de cauda, o gato doméstico é o único capaz de andar com a cauda erecta.

· Os gatos domésticos detestam limões, laranjas ou qualquer outro citrino.

· Após uma refeição, os gatos lavam-se imediatamente. Porquê? É o instinto de sobrevivência que os leva a agir de modo a que os predadores não sintam o odor da comida e possam atacá-los.

· Os gatos são os mamíferos com os olhos maiores, proporcionalmente ao tamanho do corpo.

· Os gatos não conseguem ver na escuridão completa.

· Os gatos sempre foram conhecidos pela grande capacidade visual mas qualquer coisa num raio inferior a 15 cm torna-se muito desfocada.

· O campo de visão de um gato é de 185 graus.

· Por serem muito sensíveis à luz, os seus olhos adquiriram pupilas verticais que quando estão totalmente aberta, ocupam uma área proporcionalmente maior do que a pupila humana.


· Ainda que alguns estudos defendam que os gatos sejam daltónicos, outros vêem afirmar que os gatos conseguem distinguir nitidamente o amarelo, o verde e o azul.

· Apenas um em cada mil gatos cor-de-laranja é fêmea.

· O QI dos gatos só é ultrapassado (no reino animal) pelo dos macacos e dos chimpanzés.


Carla Nogueira

 
O gato

I

O gato do quadro parece real
- glória ao seu criador!

Ando pela sala e ele segue-me,
com aquele olhar de felino triste.
Sento-me e ele observa-me,
com aquele olhar de felino ausente.

Olho-o bem nos olhos, fixamente,
e ele fita-me com se quisesse
dizer-me, ronronando baixinho:
“Oxente! Nuca viu um gato pintado?”

Malfadado gato que quer dar-me lições.
De sermões estou eu farto!

II

Malvado gato.
Mordeu-me um dedo,
arranhou-me um braço.

Mijou na sala,
partiu um vaso chinês.
Maltês parvo e rebelde!

Mas eu perdoo, enlevado.
Miado chorão, olhos de traço,
bagaço de perdição.

Vem cá Tigre, vem ao dono!
Ele vem a medo. Chiça!
Mordeu-me um dedo,
arranhou-me um braço.

Raios partam o gato!

Vilamoura, 01.06.2002 e 08.11.2002
Das Coisas e da Natureza

 
Participação especial do - Percepções do meu olhar




 
O GATO

Debruçado sobre a tarde
o rafeiro orfão
na rua
farejando
enquanto
se aviva a silhueta no cume de um telhado
sem ar de pombas
ou pássaro que respira breve e foge
saltitando;

enquanto o rafeiro late
fareja,
irrequieto
aborrecido
ou alarmado

este gato corteja
e é higiénico.


O GATO #2

Recrio a imagem negra do gato que atravessa
abrupto e travesso
as sombras nos telhados de onde parte
e se some sem que inteligência e pensamento humano
o assalte

nem areias, nem asfalto, nem os faróis
como pequenos sóis que lhe não ensinaram

atravessa negro e a sombra porque é noite sem luar
só latido de cães ao longe e roncar de motores,
ele é gato sem que suspeite ser gato
e negro e sombra
que atravessa.


José Alexandre Ramos

 
ART ATACK



 
Esta semana é dia de Gato, vamos lá então a saber algumas curiosidades sobre esta espécie animal que acompanha a vida de alguns de nós.

Algumas diferentes formas de chamar GATO, Francês - Chat, Alemão – Katze, Italiano – Gatto, Espanhol – Gato, Holandês Kat, Grego – Gata, Turco – Kedi.

Se o teu gato ronrona é porque está relaxado e satisfeito.
Os olhos dele brilham no escuro? Claro, pois possuem uma camada de células reflectoras por detrás da retina chamada tapetum lucidum, assim o felino aproveita melhor a luz.

Porque afia as unhas? Os gatos adoram marcar o seu território, daí o fazerem em sítios visíveis como sofás e cortinados.

“A curiosidade matou o gato” , ditado originado na Grã-Bretanha, o gato além de cauteloso é muito curioso.

“O Gato comeu a sua língua?”, Há uma história antiga sobre um rei que era muito duro com os prisioneiros, e adorava gatos. Um dia mandou cortar a língua a um infeliz e estando o seu gato predilecto a seu lado, ofereceu-lha, como guloseima.

Fazer de gato e sapato – Abusar, manipular.

Viver como cão e gato – Viver sempre com embirrações às turras.



O gato lembra-se de ti nos intervalos. Espera
De olhos acesos as histórias que nos contas.
Passeia-se inquieto sobre o meu parapeito e eriça
O pêlo, cúmplice, quando pressente que regressas.

Chegas sempre de noite. Sei quem és e ao que vens
E ofereço-te o silêncio de um pequeno quarto recuado,
As sombras das traseiras na minha pele, o tempo
De repetir um gesto inevitável. Ouço-te contar
A mesma lenda com lábios sempre novos. Aprendo-a
E esqueço-a . nunca a saberemos de cor, o gato ou eu.

Depois partes. Levas contigo a tua voz, mas a música
Fica. Eu fecho as portadas devagar. O gato mia baixo
À janela. Ninguém acena: guardamos com os outros
O segredo das tuas visitas. Ambos. O gato e eu.


Maria do Rosário Pedreira
In A casa e o Cheiro dos Livros
Gótica, Editores

 



2004-02-17

 
Frank e Gary

Frank acorda, olha à sua volta e vê a roupa da véspera espalhada pelos cantos do quarto de hotel. Estende a mão e sente, na sua almofada, os cabelos de Gary que permanece a dormir. Fica assim embevecido a olhar aquele mar de cabelos revoltos que gosta de acariciar quando fazem amor.

Levanta-se num pulo e é ainda nú que se acerca da janela. O sol brilha lá fora para coroar aquele dia tão especial para ambos. Chegaram ontem de Boston e hoje, graças a um Juiz de São Francisco poderão celebrar, num casamento, os votos que as bocas já sussurraram. São apenas um casal homosexual entre outros tantos que têm chegado em vôos dos mais diversos pontos do país a São Francisco. Num país governado por um conservador como George W. Bush, São Francisco é um oásis de pouca dura, onde os casais homosexuais se podem casar.

Gary levanta-se e abraça-o por trás. Um único pensamento une os dois "era bom que não houvesse proibições ao amor nas suas mais variadas formas."

2004-02-16

 


Toda a gente faz amor - Pascale Clark

O livro conta a história de três amigas, Maud a que controla, Gertrudes a que se entrega e sofre desilusões após desilusões e Clara, a protagonista e narradora, que se esconde por detrás de uma ironia amarga e que sofre com a virgindade que ainda conserva pensando ser (já) um caso clínico.

Trata-se de um livro ligeiro porém de leitura agradável.

Não suporto os olhares inquisidores sobre a minha solidão. Os outros não compreendem, não se dão bem com os desalinhados. Invejam o meu percurso a solo, procuram o erro, titilam o mistério. Como se as minhas razões lhes fossem devidas.



 



Cold Moutain

Cold Moutain é uma bela história de amor em tempo de guerra. Na América, em
1860 Inman parte para a guerra, deixando atrás Ada, a mulher que mal teve
tempo de começar a amar.
Sobrevive graças à lembrança do amor que o acompanha, e acaba por desertar
para ir ao encontro do amor. Uma luta pela sobrevivência numa viagem difícil
e cheia de obstáculos.
Ada por sua vez também luta pela sobrevivência após a morte de seu pai. Não
há comida, não há dinheiro apenas desespero, até que lhe chega ajuda pela
mão de Ruby uma excêntrica trabalhadora, protagonizada por Renée que bem
merece o óscar de melhor actriz secundária, para o qual está indicada.

 



E o próximo James Bond é...?

Ao que parece Pierce Brosnan chegou aos 50 anos, bem conservados diga-se, e diz adeus ao charmoso James Bond. Na lista de candidatos para o novo papel de 007 temos: Hugh Jackman, Jude Law, Christian Bale, Orlando Bloom e Colin Farrell.
Eu apostaria no Hugh Jackman e tu?


 
Um livro, 40 poetas, 3 Faroleiros

É já no próximo dia 28 que será feito o lançamento da Antologia poética - Na voragem dos dias que conta, entre muitas outras participações, com poemas de Cristina Augusto, Paula dos Santos e Pedro Farinha.

O convite para o lançamento fica feito. Aparece !


CONVITE

Lançamento do livro "Na voragem dos dias - Antologia Poética"

Local: Auditório da Biblioteca Municipal Orlando Ribeiro
Antigo Solar da Nora - Estrada de Telheiras
Lisboa

Data: 28 de Fevereiro
Hora: 16,30 H

Acessibilidades:
Transportes públicos -
Metro: Saída de Telheiras para o lado do colégio alemão
Carris: 47; 67; 78

Participação: Escola Moderna de Jazz do Seixal

 
Abandono

O Rui Luís Lima, a seu pedido, sai d'O Farol das Artes. Diz que se vai dedicar a outros projectos, boa sorte para eles e para ele.

2004-02-15

 
Alvaro de Campos

Lembro-me bem do seu olhar.
Ele atravessa ainda a minha alma,
Como um risco de fogo na noite.
Lembro-me bem do seu olhar. O resto ...
Sim o resto parece-se apenas com a vida.

Ontem passei nas ruas como qualquer pessoa.
Olhei para as montras despreocupadamente
E não encontrei amigos com quem falar.
De repente vi que estava triste, mortalmente triste,
Tão triste que me pareceu que me seria impossível
Viver amanhã, não porque morresse ou me matasse,
Mas porque seria impossível viver amanhã e mais nada.

Fumo, sonho, recostado na poltrona.
Dói-me viver como uma posição incómoda.
Deve haver ilhas lá para o sul das cousas
Onde sofrer seja uma cousa mais suave.
Onde viver custe menos ao pensamento,
E onde a gente possa fechar os olhos e adormecer ao sol
E acordar sem ter de pensar em responsabilidades sociais
Nem no dia do mês ou da semana que é hoje

Abrigo no peito como a um inimigo que temo ofender,
Um coração exageradamente espontâneo
Que sente tudo o que eu sonho como se fosse real,
Que bate com o pé a melodia das canções que o meu pensamento canta,
Canções tristes, como as ruas estreitas quando chove.

2004-02-14

 


Poema de Amor

Esta noite sonhei oferecer-te o anel de Saturno
e quase ia morrendo com o receio de que ele não
te coubesse no dedo

Jorge de Sousa Braga

Foto de Andreas Bitesnich


 
Teaser


E dia 28 de Fevereiro já sabes o que vais fazer ?

 
Longe do olhar dos outros

Tempo branco, tempo de nenhuma paixão.
Desce ao âmago desta cela.
Debruça-te para o interior do meu vazio.
Nenhum rosto, nenhum pensamento, nenhum gesto inútil.
Nenhum desejo — porque o desejo precisa de um rosto.
E no lugar daquele que partiu acende-se a noite. Pressente-se a morte.
Mas no fundo de mim carregas ao ombro uma chapa de aço, em forma de sol apagado.
O teu corpo fundiu no silêncio do meu.
Dormimos na espessura da poeira, e nela suspendemos o tempo.
Abandonamos a alma.
Esquecemo-nos.
Nada sentimos, nenhum acto se realiza.
Nenhuma alegria ou tristeza.
Apenas matéria, matéria deixada à voragem dos escombros e da ferrugem.
Agora podemos tocar, enlear, comprimir ou distender os corpos.
Construir formas com eles e deixá-los, assim, numa melancólica eternidade.
Longe do olhar dos outros, respiramos ao mesmo tempo - como uma só engrenagem, única e bela.
Resquício de memória que se apaga lentamente, sem que ninguém dê por isso.

Al Berto, in O Anjo Mudo


2004-02-13

 



A Casa assombrada

Hoje fui ver este filme com os meus rebentos. Um filme giro para a criançada, onde não faltam esqueletos, fantasmas e muitos mortos, e ainda tem a boa disposição e aquele "smile" divino do Eddie Murphy!
Espero que hoje me deixem dormir!

 


Black Cat de Lora Shelley

Eu hoje não coloco mais nenhum post, porque me disseram que blogar à sexta-feira 13 dá azar.

2004-02-12

 
Como não tive tempo para escrever mais nada, aqui fica o meu contributo

Olhando-te

Quedo-me, olhando-te
nesse perfil de musa mimada,
irrequieta, manietada
por medos e sonhos vagos.

Olho os teus olhos vadios,
aqueço-te o corpo com um beijo.
Desperto, sem querer, o desejo,
desvendando doces segredos.

E o amor solta-se sobre os meus dedos.

Lisboa, 10.01.2003

 


O Olhar

Gosto das pessoas que olham olhos nos olhos e são sinceras no olhar. Penso que um olhar exprime muito daquilo que somos, bem como o nosso estado de espírito! Há olhares que recordo ... ternurentos, amigos, sinceros! Gosto de registar para a posteridade os olhares daqueles que me rodeiam, em fotos. Eles naquele momento estavam a olhar para mim ... ou para a objectiva?


Para além de olhar para as pessoas, também gosto de olhar a natureza e as construções erguidas pelos humanos. As pessoas passam e os lugares/ obras ficam até a eternidade. Gosto de pousar o meu olhar em coisas belas e magnificentes como estas construções erguidas há cerca de 2000 anos na capital da Província da Lusitânia -Emerita Augusta (actual Mérida) onde ontem fui repousar o meu olhar. E, apesar de já conhecer, ainda hoje os meus olhos se impressionam com o teatro ... Gosto de me sentar e imaginar uma peça a ser ali representada há 2000 anos atrás!




 
Azul

É o azul impossível do teu olhar
Que me irrita.
Porque fere,
Toca, foge
Mas não fita...

Fernando Tavares Rodrigues
In O Amor (Im) Possível
Hugin Editores


O olhar é um pensamento.
Tudo assalta tudo, e eu sou a imagem de tudo.
O dia roda o dorso e mostra as queimaduras,
a luz cambaleia,
a beleza é ameaçadora.
- Não posso escrever mais alto.
Transmitem-se, interiores, as formas.

Herberto Helder

ENCANTAMENTO

há uma palavra mágica que se diz. essa palavra
é sempre diferente, montanha, precipício, brilho.
essa palavra pode ser um olhar, a voz. um olhar.

essa palavra pode ser o espaço de silêncio onde
não se disse uma palavra, brilho, , montanha.
essa palavra pode ser uma palavra, qualquer palavra.

há uma palavra mágica que se diz. há um momento.
depois dessa palavra, só depois dessa palavra,
pode começar o amor.

José Luis Peixoto
(in - A Casa, a Escuridão - Temas e Debates)

 
A evolução do (meu) OLHAR

Recuando na máquina do tempo, assistindo em câmara lenta a um filme a preto e branco, o primeiro olhar que retenho é o teu, Pai. Nem precisavas falar, os teus olhos diziam tudo, revelavam o cansaço, a disposição e mantinham o respeito. Ainda hoje tens essa sabedoria de saber falar com poucas palavras.

O segundo olhar foi num crescimento que se impunha, as regras da atracção nas escolas, os olhares, do Gosto de ti! Ou do Não gosto de ti! A sedução, a conquista, a vontade de ir mais além, de crescer rápido (erradas teorias) ...

Depois veio a paixão, no teu olhar, essa ânsia de ficar colada a ti, de não mais me separar, o desejo, a paixão, o amor – No teu olhar.

Hoje os olhares são outros, já não há pressa de crescer, há gosto de viver um dia de cada vez, de ver crescer, de acompanhar, ver esses olhares sorridentes que brincam, gritam, choram e crescem, na vida, inevitavelmente procurando outros olhares.

 
"O OLHAR DAS PALAVRAS"

Quando Max Broad chegou ao café reparou numa rapariga debruçada sobre uma mesa situada na zona mais escura da sala, escrevia algo em páginas soltas, mas a sua atenção rapidamente foi dirigida para alguém que amigavelmente lhe tocara no ombro. Era Franz acabado de chegar e com ele, Ottla, bela e sorridente. O chá foi servido e o tema da conversa surgida foi inevitavelmente Felice Bauer.
No entanto o olhar de Max, por vezes regressava à misteriosa dama, meio escondida no fundo do salão...até que uma carruagem parou em frente do café e duas crianças acompanhadas por uma senhora, correram na direccção da dama misteriosa, e uma delas gritou mamã, enquanto a outra agarrada ás saias da mãe, sorria mostrando uma pequena boneca que segurava com a mão direita. Por fim, aquele quarteto abandonou o café e dirigiu-se para a carruagem que as aguardava.
Franz que continuava a falar do seu amor, com a irmã, não reparou que Max se tinha levantado..e quando o viu a dirigir-se para o fundo do salão chamou por ele. Max Broad num pequeno gesto quase invisível, apanhou a folha manuscrita caída junto da mesa, onde anteriormente se encontrava a misteriosa dama...pegou nela, e dobrando com cuidado, guardou-a no bolso do casaco, regressando ao convívio dos amigos.
Entretanto Ernest Weiss, juntou-se ao grupo e a animada conversa teve a sua continuação, mas Max estava desejoso de ler, as palavras manuscritas, secretamente guardadas no casaco. E arranjando o pretexto de necessitar de tabaco para o cachimbo, saiu do café e dirigiu-se para o outro lado da rua...caminhando em direcção ao jardim e sentou-se num banco escondido dos olhares alheios. O céu azul de Praga chegou e ele lentamenrte iniciou a leitura...a arte de escrever...era o título do manuscrito...e o seu olhar foi percorrendo os caminhos criados pelas palavras, por vezes voltava atrás na leitura, porque nem sempre era fácil decifrar todos os versos...mas continuou, até que a noite se começou a anunciar, com o bater do velho sino da Catedral.
Regressado ao café verificou que os amigos já tinham partido. Sorriu para si mesmo e seguiu para casa. Depois de jantar, sentou-se no sofá, onde se encontravam imensos escritos de Franz, ainda por ordenar, pegou neles e dirigindo-se até à secretária onde habitualmente trabalhava, deixou-os ali a repousar, para no dia seguinte, retomar o seu trabalho. Na verdade o que lhe interessava naquele preciso momento, era olhar o caminho das palavras indicado no pequeno poema e assim fez. Analisou uma a uma as palavras e os seus significados e sentiu nele o olhar da escrita, aquele texto/poema possuía no seu interior uma nova forma de vocabulário (in)visível e pela primeira vez sentiu o impulso de escrever um poema...ele o novelista e ensaísta, amador, acabou por escrever um poema.
......
Muitos anos depois ao visitar o cemitério judeu onde Franz Kafka repousava, ao tirar um pequeno lenço devido às memórias surgidas, Max Broad reparou que aquele folha já amarelada pela passagem dos anos, com um poema escrito por uma desconhecida, porque ele não estava assinado, ainda permanecia consigo.

RUI LUÍS LIMA.....12/02/2004

 
O teu olhar...


Foi o teu olhar
Que nos meus olhos penetrou
Foi o teu olhar
Que vários sonhos despertou
Foi o teu olhar
Que outra forma de comunicar me mostrou...

Os teus olhos falaram-me
Deles nem recordo a cor
Os teus olhos mostraram-te
De ti nem sei o nome
Os teus olhos revelaram-te
Sem que a tua voz tivesse ouvido

Ai.... o olhar!.....
Sublime forma de comunicar
Desejo, admiração,
Amor, paixão,
Alegria tristeza,
Sonho, decepção...
Mais que nas palavras descobri no teu olhar
Melhores formas de comunicar!

O olhar....

 
Participação especial do Aviz


As luzes acendem-se em nome de todas as coisas.
Cada um escolhe o seu olhar, a sua sombra, o seu
nome; não pode ser de outra maneira a vida que
escolhemos, nem aquela que havemos de viver.

Onde poderemos encontrar refúgio senão nos dias
que se aproximam? Fazes perguntas, olhas os faróis,
as gavetas cheias de papéis, as varandas dependuradas
na tarde. O Inverno é longo, o seu nome salva-nos,

as luzes acendem-se uma a uma, um dia depois
do outro. Não há segredo, nenhum mistério, só
um risco no céu, um desígnio, um sinal, um aviso.
Fica um olhar, uma palavra a menos no meio da vida.

Francisco José Viegas

 
Muitas são as pessoas que se cruzam comigo no dia a dia.
Por vezes são ombros que se encontram num encontrão ocasional, por vezes são dois corpos que se encostam num abraço metropolitano. A maior parte das pessoas que comigo se depara nessas ocasiões suporta facilmente a dureza do meu ombro ou o desconforto do contacto apertado e não desejado.
Mas raras, muito raras, são aquelas que aguentam um olhar. Desviam os olhos mal os nossos olhares se cruzam, fogem deles como se o olhar matasse, rasgasse a roupa ou visse os seus segredos mais escondidos. Num elevador é um verdadeiro bailado de olhos a se evitarem num espaço tão apertado, enquanto o constrangimento desce até ao rés do chão.
Mas por vezes encontro outros olhares a percorrerem os rostos vazios que nos cercam no dia a dia. Olhares que procuram uma centelha de brilho por detrás daqueles rostos cansados e esses olhares, quando cruzam o meu, abrem-se num sorriso.




 
Olhares...

Olhei sem sentir um olhar cansado que me estudava as formas turvas e fugidias.
Olhava sincero de dias vividos em calma harmonia com o tudo e o nada que a vida emprestava.
Olhou com certeza de ter já visto uma, duas, todas as vezes no sempre e no nunca de um dia eterno.
Olhares que se afastam e juntam no fim do nada princípio de tudo, horizonte infinito.
Olhavas tu que não eu para mim que não tu mas um só, juntos para sempre na mais pura solidão de um mundo inteiro, multidão silenciosa que olha mas não vê senão tu e eu.
Olhamos agora, mais logo ou nunca talvez, sempre por certo sem ninguém por perto que olhe por nós.
Olhámos ontem ou hoje, pois já não olhamos, morreu o olhar mas nunca a certeza de poder um breve momento para sempre durar.

Gustavo Vasconcelos - |a voz|

 



2004-02-11

 
Vasco Graça Moura ganha Festival de Poesia de Struga

O escritor e eurodeputado do PSD Vasco Graça Moura ganhou a Coroa de Ouro do Festival de Poesia de Struga, na Macedónia, um galardão que há 50 anos distingue obras de poetas de todo o mundo.

Podes saber mais aqui


2004-02-10

 
Esta imagem choca-te ?


Não ? A mim também não: uma freira na escola.
O que me choca é ter sido hoje aprovada uma lei em França que proibe o que a imagem nos mostra. A freira teria de trocar o seu hábito por outra roupa para poder assistir às aulas.
Claro que foi mais a pensar nos véus islâmicos que nas freiras que tal proibição surgiu e o argumento ridículo que é para a defesa da laicicidade do estado é rísivel. Penso que ninguém sonharia sequer que a presença de diversos alunas com véu islâmico poderiam apontar para que o islamismo fosse a religião oficial francesa !

É tão atentatório contra a liberdade indívidual a obrigação do uso de um símbolo religioso como a sua proibição.

Duvido ainda da aplicabilidade da lei. Certos símbolos religiosos são também símbolos culturais e não é fácil saber onde começam uns e acabam outros. Isto já sem falar nas T.shirts com Cristos por exemplo. São mais ou menos religiosas que T.shirts com Che Guevaras ?


Existem no entanto alguns argumentos que são utilizados por pessoas bem intencionadas, como Esta lei impede o uso dos véus islâmicos por pressão familiar e religiosa. Ora a verdade é que se uma jovem é pressionada pela família e pelo seu meio social à sua utilização, dificilmente será uma lei que mudará as coisas. Até pode ser que continue a frequentar a escola e que lá não use o véu, mas essa é uma parte do dia de uma pequena parte da sua vida. Ou será que os funcionários públicos franceses irão sofrer igual proibição ?

Também é vulgar ouvirmos que este tipo de lei visa facilitar a integração. Nada mais errado. Este tipo de lei ajuda a criar um estigma e, por outro lado, ao agredir as convicções religiosas de um povo torna-o obrigatoriamente mais unido e mais distante do resto da sociedade francesa. Isto já sem falar de como a lei só é aplicável a escolas públicas, rapidamente iremos ver nascer escolas islâmicas o que não me parece que favoreça em nada a integração.

Esta lei é um sinal preocupante de intolerância religiosa e de xenofobia, e quando oiço, como foi o caso na RTP1 hoje, uma mulher francesa defender a lei e dizer que se ela experimentasse ir para o país deles de calções também não deixavam fez-me lembrar que apesar de já ter visitado vários países o único sitío onde não pude entrar de calções foi no Vaticano.

 
Isto de ir morrer daqui a pouco
traz um certo sentido ao que vou sendo,
e dá ao que imagino a consistência
de uma verdade que ninguém contesta.
Assim pousado a metros de distância
tu me transformas em aranha ou sapo,
e nos teus olhos há uma serpente
capaz de me matar a vida inteira.
Não há maneira de voltar a ser
feliz, nem mesmo de palavras feito,
ou com santa prosódia conseguir
que alguém, do outro lado, me responda.
Antigas letras estas, não vão ter
sorte melhor do que ás modernas deste.

António Franco Alexandre
(in - Duende)
Assírio e Alvim

2004-02-09

 
Vamos ter um Ministro da Cultura competente em Portugal !

Chama-se Gilberto Gil e virá abrir o Rock in Rio no dia 29 de Maio em Lisboa.

No dia 6 de Junho quando o festival acabar lá regressaremos à qualidade ministerial e cultural habituais.

P.S. O Rock in Rio também já tem um blog mantido por uma jornalista brasileira.


2004-02-08

 



Anything else - A Vida e Tudo o mais

O mais recente filme de Woody Allen, não nos traz nada de novo, é um filme à Woody Allen!
Mas mais uma vez temos aqueles deliciosos diálogos na cidade de Nova Iorque a que nos habituámos a ver nos filmes deste realizador. É um filme bem disposto a Ricci está divina fazendo de "gato sapato" o seu namorado! Gostei de ver, é leve, irónico bem humorado, subtil q.b.

 
"AS NOVIDADES LITERÁRIAS DE FEVEREIRO"

Apesar do mês ser um pouco maior do que é habitual, mais um dia...este post habitual chegou tarde...mas ainda a tempo...apesar de a fnac estar em saldos este mês.
Sendo assim não nos podemos esquecer que o primeiro volume de contos de Franz Kafka vai finalmente surgir e também outro contista, o célebre autor de "Blade Runner" Philip K. Dick irá ter os seus contos publicados.
Será sempre de lembrar que "A Mancha Humana" de Philip Roth vai aparecer possivelmente ao lado de "O Ofício de Viver" do Cesare Pavese que tão esquecido tem andado dos nossos editores.
Por outro lado, amantes da História Nova, não se esqueçam de "Em Busca da Idade Média" do Mestre Jacques Le Goff que tantas horas de prazer me ofereceu no passado....e claro de um outro Mestre, este da Literatura....é verdade...estou a falar do Nabokov e do seu indispensável "Lições de Literatura"
Nos dramaturgos não percam o meu querido Thomas Bernhard e o seu "O Fazedor de Teatro" (aproveitem e comprem "O Naufrago"- Sintra e Lisboa "navegam neste livro") e para terminar a POESIA....para os "apaixonados" pela poesia de Maria do Rosário Pedreira (eu sou um deles), não percam " Nenhum Nome Depois" e para terminar porque as bolsas cada vez estão mais pequenas e vazias...apenas dois títulos..."O Mel" de Tonino Guerra lembram-se fo filme que o Vicente Jorge Silva realizou em Porto Santo?...e o fabuloso Philip Larkin, que finalmente regressa nao nosso convívio com "Janelas Altas"
No próximo mês aqui estarei com mais novidades....boas compras e cuidado com os cartões de plástico.

RUI LUÍS LIMA

2004-02-07

 



21 gramas

Ao contrário do título, 21 gramas, é um filme bem pesado! Do realizador de Amor Cão, chega-nos a história de 3 pessoas, Christina sofre a perda do marido e das duas filhas, Paul em perigo de vida aguarda um dador de coração, e Jack um padre alcoólico é o responsável pelas mortes. Os destinos acabam por se cruzar, um filme que nos fala de perda, vingança e muita dor.
A ver.

 


Abre para cá

Trata-se de um livro de contos de Jacinto Lucas Pires, dividido em duas secções Terceiras pessoas e Primeiras pessoas consoante a pessoa em que o narrador se expressa. São histórias do quotidiano cheias de sensibilidade e de prosa poética como já nos habituou este contista, cronista, realizador e blogger.

O principal defeito que tem o livro é que chegou ao fim num instante...

... e agora corriam com uma força terrível e nada os poderia parar, e a mãe foi a primeira, baixou-se e pôs a mão na cara do corpo, como se a mão pudesse negar o buraco de sangue que era aquela cara, e só ao sentir que a mão vinha cheia de sangue do filho é que a mãe viu a verdade e então gritou um grito muito agudo que calou os campos e os pássaros, e era como se lhe estivessem a cortar a garganta e ainda houvesse som, um som sem sentido, e a mãe batia com os punhos fechados no peito e os olhos tinham-lhe entrado no rosto e estavam escuros, no fundo, muito abertos, virados para o céu ...

extracto do conto Um pontinho entre os olhos

2004-02-06

 
Big Fish - O grande peixe


Tim Burton regressa ao écran da sétima arte com uma excelente fábula.



A relação de um pai Edward Bloom, grande contador de histórias da sua vida, e o seu filho Will que teima em procurar as fronteiras da fantasia e da verdade.



Uma relação comovente, na procura de algo que por vezes mais vale estar numa história, nem que esta seja povoada por gigantes, gémeas siamesas, bruxas e outras personagens bizarras.



Recomenda-se vivamente! A banda sonora foi nomeada para um óscar e facilmente se percebe porquê.

 
Blogues discutidos no Fórum Económico Mundial

Os blogues estão a transformar os consumidores de conteúdos mediáticos em produtores desse tipo de conteúdos - referiu Jay Rosen, responsável pelo Departamento de Jornalismo e Comunicação de Massas da Universidade de Nova Iorque, segundo a informação disponibilizada pela organização do sítio do Fórum na Web ( www.weforum.org ). "É um desenvolvimento radical incrível, o mais excitante que vi na minha carreira como intelectual e crítico", afirmou Rosen.
Pedro Fonseca
Retirado do Público

Não sei se será tanto assim, mas a verdade é dou por mim muitas vezes e após ler uma noticia num jornal ou na TV, ir "cuscar" alguns blogues para ver qual a versão deles dos factos ou a sua opinião critica.


 
LÍDIA JORGE

Ontem assisti a um encontro com a escritora Lídia Jorge na livraria Sítio das Letras em Reguengos de Monsaraz. Prendia-se divulgar o seu último livro "Vento assobiando nas gruas" e o contacto com o público.
Apenas tenho e li um livro desta escritora, A costa dos murmúrios, e confesso que não gostei! Mas, como gosto de enfrentar desafios e de dar uma segunda oportunidade decidi ir assistir ao encontro, para ver se ela me convencia a ler os seus livros através do uso da palavra...
E confesso: Gostei de escuta-la! Falou, de forma romanceada da herança bibliográfica que se recebeu do seu bisavó e que alimentou a sua infância, do gosto pela escrita que cultiva desde a infância...
De entre as várias mensagens que deixou realço uma ( e espero transmitir o espírito): No mundo em que vivemos há um diálogo que está sempre incompleto entre os seres humanos, mesmo entre aqueles que se conhecem profundamente. Escrever é uma forma de contribuir para completar esse diálogo!
Vou dar uma segunda oportunidade à escritora e começar pelo primeiro dos seus livros !
Depois direi de minha justiça!
Fiquem bem

 
Medo de ter medo


Ontem não me foi possível "postar" sobre o medo; mas hoje não me esqueci de o fazer! E é de realçar que vim expressamente à Biblioteca Municipal de Beja ( que presta um óptimo serviço público) para ter acesso à Internet... pois estou em Beja devido à minha vida de caixeira viajante!
Durante a viagem de ontem, reflecti sobre os diversos medos e as diversas formas de os ultrapassar!Todos temos muitos medos; mas na minha opinião, o pior medo que temos é o de ter medo de ter medo :da morte, da doença, de amar e de sofrer, de respirar, de pensar em voz alta e de lerem os nossos pensamentos, de viver! O medo de ter medo atrofia-nos os pensamentos, os movimentos e leva-nos a uma total imobilidade total de actos, pensamentos, palavras, gestos e movimentos! Como vencer este medo de ter medo? Não possuo dons mágicos, não sou Deus, mas penso que a melhor maneira de enfrentar este medo de ter medo é ter alguns medos e assim eliminar a hipótese de termos medo de te medo ... é concretizar os nossos medos! E a esses ? como ultrapassa-los? É enfrenta-los e tentar ultrapassa-los para voltarmos a ter novos medos! Porque quem não tem medos não deve ser humano... o desafio, a luta, a dúvida faz parte da condição Humana e .... crescemos quando ultrapassamos cada nova etapa !

 
A utopia em marcha

As cores do globo, Associação para a promoção do Comércio Justo, fazem-me chegar a sua newsletter e um convite para a abertura da Mercearia do Mundo na baixa lisboeta. Existem coisas em que o minímo que podemos fazer é divulgá-las, vamos lá a isso.

Uma grande parte da produção mundial é realizada por trabalhadores dos países do sul que vivem em condições de miséria extrema. Face a este quadro, o comércio justo, nascido nos anos 60, constitui uma parceria entre produtores e consumidores que procura combater as injustiças do comércio global, criando meios e oportunidades de melhorar as condições de vida e de trabalho nos países subdesenvolvidos. A sua missão é a de promover a equidade social, a protecção do ambiente e a segurança económica através de uma rede de comércio alternativo, baseada em princípios transparentes e intransponíveis, e da criação de espaços de informação, debate, crítica. Como este. Oferece pois uma oportunidade efectiva para a concretização de ideias tão faladas como a de "desenvolvimento sustentável", a de "consumo responsável" e a de "cidadania global".
Face a este enunciado, a resposta mais frequente, pelo menos em Portugal, é: "isso é uma utopia". E a nossa resposta é, invariavelmente, "E daí? Qual é o problema?". Nos países pobres do sul do planeta, milhões de trabalhadores pertencem já a cooperativas locais, produzindo sob princípios éticos em termos sociais e ecológicos, conquistando condições de trabalho dignas e que lhes permitem escapar à miséria. E na Europa, centenas de associações sem fins lucrativos, baseadas no esforço de milhares de voluntários, organizam-se e desenvolvem um sem número de actividades que visam divulgar o conceito e comercializar os produtos. A "utopia" movimentou 400 milhões de euros na Europa, no último ano. A utopia está, então, em marcha.


Convite - Abertura da Mercearia do Mundo

Lisboa Tem Coração Mais Justo

No próximo dia 7 de Fevereiro, no nº 17 da Rua de S. José (perto do Coliseu dos Recreios), abre a Mercearia do Mundo, a primeira loja lisboeta de Comércio Justo. A partir deste dia, de segunda a sexta, e aos sábados até às 15h00, poderá comprar artesanato e produtos alimentares de grande qualidade, produzidos nos países mais pobres do hemisfério sul, contribuindo desta forma para um consumo ético e responsável que assegura a produção em condições dignas.

A Cores do Globo - Associação para a Promoção do Comércio Justo convida-vos a presenciarem este momento histórico em que a cidade de Lisboa abrirá as suas portas a um mundo mais justo. Apareça na Mercearia do Mundo, conheça o Comércio Justo, explore a loja e as actividades propostas, e traga as crianças, pois também haverá actividades infantis. A Mercearia do Mundo estará aberta todo o dia, logo a partir das 11:00 para um pequeno-almoço justo!

Está também convidado a participar no leilão de arte (disponível para licitações online em leilaocj@yahoo.com), lançado a partir das 16h e que durará até dia 6 de Março.

Esperamos por si, por um mundo mais justo!



2004-02-05

 
Depois de ler o teu texto, senti a falta da tua fotografia...



 
Ao sabor das velas


Hoje não me apetece escrever. Tentei, em vão, procurar nestas paredes desarrumadas, algo que merecesse a pena ser abordado, mas hoje não me apetece mesmo nada escrever. A casa é a mesma, as pessoas são as mesmas, o trabalho é o mesmo. O pequeno almoço de hoje foi igual ao de ontem e as calças que escolhi já as tinha usado uma vez esta semana. Há dias em que nos sentimos assim: apertados dentro de nós e sem vontade de sair desta sensaboria.

Nestas alturas em que nada sucede e a vida parece parada, os dias demoram-se e as noites são compridas. Quando o corpo se esquece de si mesmo, acomodado e ausente, o pensamento dispara num conjunto de associações que nem sempre são as melhores. Sinto Medo. As dúvidas parecem não ter fim e a saudade – não sei bem de quê - não cessa. O tempo deixa de ser apenas teempo e as palavras, essas, nem sequer são só palavras. Aqui, há tristeza em cada suspiro e querer em cada olhar. Mas é um querer fraco, sem manifestação exterior. Um querer com outros olhos porque estes nem conseguem fixar o que querem: perdem-se em amplas superfícies, sem nunca concluir a sua procura.

Nestes momentos não há memória que não seja relembrada. A análise surge e com ela, o desespero. Chama-se a isto um outro tipo de tempo. Um tempo que arde e corrói. Um tempo que queima. Um tempo igual à chama de uma vela que arde consumindo.

Lembrei-me agora do tempo em que as velas eram todas de um branco-amarelado e ardiam nas igrejas ou em casa, quando a electricidade faltava. Eram mágicos os momentos em que a luz faltava e a família se reunia em um único compartimento da casa, ao sabor da chama de uma vela ou de um candeeiro. Naqueles momentos ficávamos mais próximos uns dos outros, falávamos mais baixo, sentíamos mais silêncio e escolhíamos melhor as palavras.

Hoje, nas igrejas, elas mantém a mesma forma, a mesma cor, o mesmo propósito. Cá fora, para além de terem ganhado outras formas, cores e propósitos, ganharam, também, outros aromas e, consequentemente, uma outra dimensão. Há, na chama das velas, estejam elas onde estiverem, uma certa quietude em movimento.

Nestes momentos de solidão forçada acende-se cá dentro uma chama qualquer, que arde, queimando-nos. A chama chama chama ... e a boca seca e não deixa que as palavras se soltem. Melhor assim! Seriam palavras de inquietude.

Mas hoje não me apetece escrever. Não me apetece ficar aqui a mastigar o mesmo sal de ontem. Apetece-me mentir, dizer aos que aqui estão que, lá fora, tenho o mundo à espera e que não me posso atrasar. Hoje a solidão não me eleva o espírito. Hoje não há nada para além da linha do horizonte.

Filomena Gonçalves

 
O Medo

Os marinheiros, dizem os franceses, “sabem fazer tudo, vírgula, mal”. Nesse sentido sou um marinheiro nato: sei fazer muitas coisas, e faço-as todas mal. Gosto de escrever – e alguns de entre vós pedem-me para escrever mais vezes; hélas, estou longe, muito longe, da perfeição. Gosto de beber – e não sou o pior nessa arte; mas cada vez suporto menos o álcool, e me suporto quando bebo. Também gosto de fotografar, mas as minhas melhores fotografias estão perdidas algures no Jura Neuchâtelois. E gosto de fazer amor – quem não gosta? É a única coisa que mais vale fazer mal do que não fazer de todo...

Gosto de fotografar como de amar: os gestos param, os olhares interrogam-se, o outro corpo deixa-se acariciar pelo tempo e pela luz, como a vida. Hoje falta-me a vontade de convencer as pequenas, e de andar com a máquina às costas, todos os dias. Mas enfim, divirto-me: faço fotografias demagógicas de leões e de girafas, sempre fáceis e impressionantes. O que já não faço são fotografias de corpos, fáceis ou não: para uns falta-me segurança e aos outros falta sentido.

Falta-me a paciência para amar porque me falta o amor tout court: para amar um corpo feminino há que amar-se, e eu não me amo, detesto-me. Claro que continuo a sonhar com aqueles dois pássaros tantas vezes na gaiola e tão bonitos fora dela, com aqueles ventres lisos como praias soalheiras e salgadas – mas são sonhos, falta-me a energia para os concretizar.

Penso muitas vezes em todas as mulheres em quem encalhei, por quem me perdi e que perdi. Cada corpo é, ou deve ser, um abismo, um recife, um porto após a tempestade, um farol no nevoeiro – nunca tive uma mulher em cada porto, mas cada mulher foi um porto para mim.

Cheguei pela primeira vez a Dunkerque num botezito pequeno, um Rush. Vínhamos de Guernesey e os proprietários deixaram-me ficar a bordo depois do transporte. Foram meses divinos: encontrei trabalho no bar do clube local, encontrei amigos, e vivia como um deus, apaziguado. Nessa altura tinha muita paciência e muita vontade de encontrar namoradas, e de dançar, de me bater nos bares (na verdade, só me bati uma vez). Encontrávamo-nos na “Pilotine”. O barman chamava-se Jean-Paul, mas eu chamava-lhe Johannus Paulus, porque ele era pedante, e eu também, um pouco.

Cada vez que abria a porta do café um braço levantava-se e alguém gritava “Jean-Paul, a primeira cerveja do Luis é para mim”, logo seguido de outro e outro e outro. Quando chegava ao balcão ainda não tinha começado a beber e já estava grosso, naquela atmosfera calorosa, excitante, selvagem. Gosto de Dunkerque como se lá tivesse nascido.

O meu amor por essas regiões começou em Guernesey: entrámos no porto com força 6 no c..., spi em cima, porque estava quase na hora de fecho dos pubs. Fizémos uma manobra magnífica: spi em baixo e nós amarradinhos no lugar. Como em todos os portos ingleses, o fiscal estava à nossa espera, e insultou-nos durante cinco intermináveis minutos: que aquilo não era maneira de se entrar num porto, que a velocidade estava limitada a três nós, que para a próxima vez nos multava, que era coisa de piratas – e terminou a lenga-lenga dizendo, muito britanicamente: “mas tenho que vos felicitar pela vossa manobra de atracação, que foi perfeita. A melhor Guinness é no não-sei-quantos-pub, corram para lá que ainda o apanham aberto”. Corremos, e eu apaixonei-me por aquelas ilhas para sempre; ao contrário da Guinness, de resto, da qual não gosto do aspecto xaroposo.

Foi o meu primeiro contacto com a cerveja e com as suas civilizações. Os monjes alemães chamavam à cerveja o “pão líquido” e Deus sabe quanto, oh quanto, eles têm razão. Era a base da minha alimentação, nesses tempos, e ainda hoje olho para a minha barriga irreductível e penso nos dias em que as cervejas que bebia eram mijadas, ejaculadas, batidas a murro, transpiradas ao som de músicas hawaianas e convertidas em intermináveis, mas geralmente recompensados, diálogos nas praias do mar do Norte.

Em Dunkerque eu tinha o barco a poucos minutos da Pilotine e era feliz, todo-poderoso, invencível. Um dia apaixonei-me: uma rapariga bela e doce, com quem vendia livros pró-independência da Flandres e fazia amor nas margens dos canais cobertos de nevoeiro. Às vezes parávamos para beber uma cerveja naqueles moínhos transformados em cafés e eu olhava para os cabelos dela, que tinham a cor da cerveja, e para os olhos, que eram azuis escuros como o mar num dia de muito vento e ainda a amava mais; e pedia-lhe silenciosamente que me perdoasse todo o mal que um dia lhe viria a fazer, e que eu mesmo ainda não sabia qual seria. Quase morri por causa dela, numa praia perto de Sintra, e ela não percebia porquê, eu nadava contra uma corrente insensata, contra uma quantidade incalculável de bagaceiras e vinho, e contra o meu medo.

Nem quando estou bem estou bem. E agora escrevo estas coisas a ouvir o Willie Nelson, que tem letras lindas sobre a solidão, e ninguém imagina a solidão e o horror em que vivo. E o medo... digo sempre ao meu filho que só os idiotas não têm medo, que ser corajoso não é não ter medo, mas sim vencer o seu medo. E tenho medo. No mar os medos são diacrónicos, vêm sempre antes ou depois do pior acontecer; não estou no mar, mas sei que o pior ainda está para vir.

Maputo, 1999.

Participação de Luis M. Serpa
www.donvivo.blogspot.com



 
Participação especial do Blogue de Esquerda

M. de Medo

Desculpem. Este era para ser um texto longo e fundamentado sobre o medo. Era para ser. Não é. Não é mesmo. Desculpem. É outra coisa. Um esboço. Uma aproximação. Um amontoado informe de ideias informes. Outra coisa. Nem menor, nem menos importante para mim. Só outra coisa. Outra coisa. Se querem saber a verdade, acho que me assustei. Acho que tive medo. Medo do que poderia dizer. É isso. Tive medo dos disparates que se dizem assim, da boca para fora, mas que nos perseguem depois, como aves agoirentas, a vida inteira. Para falar do medo é preciso ir muito fundo, muito longe, lá onde já não resta nenhuma luz. Não me sinto capaz de uma tal viagem. Quero dizer, hoje. Quero dizer, agora. Fico por isso à superfície, nesta ténue superfície de gelo por onde seguimos, deslizando de olhos fechados. Cegos.
O medo. Só me lembro de dois. Os mais óbvios. O medo de nascer: aquele terror de estar dentro da mãe, protegido do mundo, escondido da essência turva das coisas verdadeiras, e depois entrar nesta realidade acesa que é a vida, o mais brutal e luminoso dos abismos. E depois, o medo da escuridão: esse espaço incerto onde se escondem os outros medos todos, acotovelando-se na sombra. O medo da escuridão, diz-se, pertence à infância. Mentira. Pertence a todas as idades do homem. Porque o escuro que tememos não é a ausência de luz, não é o lado mais secreto da noite. É a morte a descer sobre todas as coisas que não vemos; a morte deixando avisos, lembretes, ultimatos; a morte recordando-nos que o tempo não arrasta só os ponteiros dos relógios. Não. O tempo também passa, como um vento feroz e carregado de areia, sobre todas as pessoas, animais e coisas que um dia descobrimos, pasmados, serem os objectos do nosso amor.

José Mário Silva

 
Medo



Este quadro data de 1954 e tem o nome de "Fear".
O seu autor é o americano Robert Vickery.

 
Não tenhas medo...


Acabei de dizer a alguém: “Não tenhas Medo!”

Medo de amar e ser amado! Afinal era isso que ele, perdido nos seus sentimentos e receios me perguntava!
Alguém que tem medo de se entregar ao amor. Alguém que tem medo de se magoar ao amar...

Agora fiquei eu com medo!
Eu que corajosamente lhe disse: “Não tenhas Medo”!
Mas fiquei com medo de sentir a responsabilidade de um coração despedaçado só porque eu lhe disse para não ter medo!

O medo povoa as mentes, instala-se nos corações, e mantém-nos suas presas.....
O medo impede-nos de sonhar! De avançar! De crescer! De lutar!

No início não tínhamos medo....
Lembras-te quando começaste a andar... nada impedia de dar mais um passo... nem uma escada que se apresentasse pela frente. A não ser que um adulto estivesse lá na frente vestido de medo e nos dissesse: pára! Vais cair! Sim... éramos felizmente cheios de coragem, sem qualquer receio das quedas.... que não conhecíamos...

Lembras-te quando já adolescente, corrias e corrias e ainda corrias mais, porque simplesmente não tinhas medo de te cansar! Eras forte e sem medos.... mas lá aparecia novamente aquele adulto vestido de medo a dizer: pára! Já chega de correr! Vais te cansar, vais transpirar, vais adoecer! Que bom que era correr e correr sempre em frente, sem limites e barreiras, sem medo....

Ah... mas lembras-te também quando partias a sonhar por caminhos desconhecidos, quando viravas na rua à esquerda ou à direita sem saber se tinha saída, subias o monte sem saber onde ficava o cume, saltavas o muro sem medir a sua altura, subias a árvore mais alta sem saber que terias vertigens!Mas lá aparecia novamente aquele adulto vestido de medo a dizer: pára.... isso é perigoso! Que bom que era fazer tudo isso sem pensar no perigo.....

Quando chegou o momento das escaldantes paixões! Hum... que espontâneas entregas ao amor, sem temer qualquer desilusão! A primeira troca de cúmplices olhares, o rubor na face quando sentíamos que ele ou ela afinal tinha reaprado em nós, o primeiro bilhete com palavras de amor sincero, o primeiro e mais doce e inocente beijo de todos! Mas... lá apareceu novamente o terrível medo, quando adultos nos tornamos e sentimos que amar também pode magoar!
Que saudades do tempo em que amava perdidamente sem pensar se amanhã continuaria a ser amada....

Bem... afinal o medo... é um dos sentimentos mais incómodos e mais castradores que possa existir!!!! Até eu estava com medo de pegar na caneta e escrever sobre ele, mas houve um momento em que tive coragem e enfrentei-o de frente e sentei-me e peguei na caneta e consegui lhe dizer, olhos nos olhos, tudo o que sinto dele!
Respeito-o, mas dispenso-o!
Quero continuar a sonhar... sem medo de acordar!

 
13 de Dezembro

…um dia começarei a redigir um diário, mas ainda é cedo, um diário requer uma entrega total, um rigor, uma disciplina, de que não sou capaz.
Tenho medo, medo de voltar a escrever incessantemente e rasgar tudo o que escrevo. Medo, medo de ouvir aquilo que não se ouve a não ser quando escrevo, como se o corpo todo estremecesse pela última vez.
...

1 de Fevereiro
visitam-me de manhã muito cedo, os mortos, vêm de um espaço onde imaginei cenas de um futuro longíquo. Vêm envoltos em pedaços de noite, luzem na água medrosa dos dedos. Visitam-me de manhã, estes espectros fugidos de algum limbo ou dalgum sonho. Vêm devagar pela estilhaçada luz das paredes, derramam lâminas para dentro do meu corpo, acordam-me para a tremenda claridade do dia.
Não tenho medo da visita dos mortos.

2 de Fevereiro
é preciso continuar acordado e ter consciência disto, manter-me acordado para que nada de perca e tude se transmude, mesmo que dolorasamente.
Este medo secreto de endoidecer, ponho-me a amar aquilo que não amo, a vida parece fazer uma trégua, é menos cruel. Acontece-me sempre assim: amar o que já não amo e dá-me sono, e sonho com aquilo que ainda não amei, durmo profundamente.

Al Berto
Excertos de O Medo
Assírio e Alvim



 
Hilda Hilst, a famosa escritora brasileira, faleceu ontem aos 73 anos de idade, vítima de doença.

Do desejo

Trechos

Porque há desejo em mim, é tudo cintilância.
Antes, o cotidiano era um pensar alturas
Buscando Aquele Outro decantado
Surdo à minha humana ladradura.
Visgo e suor, pois nunca se faziam.
Hoje, de carne e osso, laborioso, lascivo
Tomas-me o corpo. E que descanso me dás
Depois das lidas. Sonhei penhascos
Quando havia o jardim aqui ao lado.
Pensei subidas onde não havia rastros.
Extasiada, fodo contigo
Ao invés de ganir diante do Nada.

Hilda Hilst
in Os Cem Melhores Poemas Brasileiros do Século
Objectiva, Editores

 
O Medo dá asas?!...

Há tratados sobre o medo. Associa-se e distingue-se o medo de receio e de temor. Fala-se de ansiedade e inúmeras fobias. Há uma ou mais casas do medo (repleta de fantasmas e seres horríveis), a Ilha do Medo (algures no Brasil), o João Sem Medo. Se não comes a papa chamo o Bicho Papão! - Coitadas das criancinhas! Há rezas a diversos Santos e Santas nas alturas de maior medo ou simplesmente para afastar os medos vindouros.
Mas não quero falar do medo receio ou do medo temor. Prefiro encarar o medo como potenciador da coragem. A velha máxima de que a coragem é a superação do medo. Essa capacidade de ultrapassar os medos e olhar em frente, caminhando entre os fantasmas. Vencendo-nos a nós próprios. Parafraseando Goscinny em “Astérix e os Normandos”, será que o medo dá asas?


 
Beatriz, 23:30


O medo invadiu o meu corpo com o arrastar dos minutos. Não que fosse verdadeiramente tarde, mas era muito mais tarde do que as horas que tínhamos combinado. Talvez a Joana tivesse razão e eu não soubesse encontrar o difícil equilíbrio entre ser um pai permissivo e um pai autoritário.

A Joana ? A ideia de lhe telefonar apareceu-me mal os ponteiros do relógio ultrapassaram as dez horas. Já tinham passado mais noventa minutos e a minha mão continuava esticada na direcção do telefone sem lhe ousar tocar... e se a Beatriz quisesse telefonar para casa a explicar o atraso e o telefone estivesse ocupado. Na verdade eu sabia que o que dominava esse meu impulso era o medo do que iria ouvir. Desde o divórcio que as poucas palavras trocadas entre mim e a Joana eram temperadas por pequenas picadas de alfinete, mas já imaginava as palavras amargas a formarem-se na boca dela – Eu bem a avisei que ter decidido ir morar contigo ia acabar mal, onde já se viu um pai deixar sair a filha que só tem catorze anos à noite com uns amigos.

Deixei-me cair da cadeira. Havia um outro medo que se sobrepunha de tal maneira a esse que as palavras dela seriam benvindas desde que chegassem depois da Beatriz. Imaginei a minha filha atropelada a sair da pizzaria, o derradeiro grito antes de tombar no asfalto... ou raptada, violada talvez, imagens assustadoras formaram-se na minha cabeça. Duas lágrimas escorreram-me pela cara e percebi como nunca conseguiria perceber a enormidade da dor de pais que viram os seus filhos desaparecerem raptados e levados para redes de pedofilia. Antes a morte... não isso, não!

Forcei-me a me controlar. Estava atrasada e era tudo. O jantar de despedida da amiga tinha-se prolongado, tinha conhecido um rapaz, sei lá, qualquer coisa. Também não era fácil para mim, a quando do divórcio Beatriz fora com a mãe, era uma criança de doze anos e agora que resolvera vir viver comigo era uma adolescente de catorze anos. O corpo ganhara forma e eu perdera aquela química que nos permitia comunicar sem palavras.

A minha garganta estava tão apertada que mal conseguia respirar, tinha de avisar a Joana, nunca lhe perdoaria se fosse ao contrário...


Estava atrasadíssima e mesmo assim hesitava em tocar à porta. Escutava já as palavras duras na boca do meu pai. As proibições para saídas futuras, a mesada cortada. A minha mãe já furiosa ao telefone pois de certeza que aqueles dois que nunca se entendiam, haveriam de unir esforços para me castigarem. Sentei-me nos degraus da entrada a mão teimosamente recolhida para não chegar à campainha.



 



2004-02-04

 

O PAULO

Nem sei o que senti naquele momento. Sei o que sinto agora. Sinto uma enorme tristeza embrulhada num fino tecido de raiva.

Esta tarde, antes de vir para casa, passei pelo supermercado porque precisava preencher o vazio dos armários da minha cozinha. Compras feitas, dirigi-me ao carro. Quando ia a colocar a chave na ignição sinto um ruido lento vindo do lado direito da rua.

Olhei e vi um homem cabisbaixo, sentado num muro, encostado ao vidro que separa quem compra de quem vê comprar. O homem desembrulhava sacos e embrulhava sacos.

Já me tinham falado do Paulo e do tempo em que se perdeu.

Conheci-o de quando vinha pedir à sua mãe - que então trabalhava comigo - uns trocos para ir ao café com os amigos. O Paulo era louro e tinha olhos azuis. O Paulo tinha muitos amigos e vestia-se muito bem. O Paulo tinha uma namorada que o amava. O Paulo tinha a mesma idade que eu.

Um dia o Paulo foi passar férias a Londres.

Meses depois regressou e vinha acompanhado de alguém mais forte que ele: a heroína. Nesse dia o Paulo causou estragos em casa. No dia seguinte perdeu os amigos e depois o emprego. Finalmente cortou as ténues relações com a família.

A Mãe envelheceu de uma só vez, reformou-se e o Paulo desapareceu.

Encontrei-o hoje, em frente ao supermercado. Mudo, sujo, de cabelo grande e barba há muito por fazer. Hoje o cabelo do Paulo já não é louro e não sei se os seus olhos continuam azuis ... apenas porque baixei os meus quando me percebi de que ia olhar na minha direção.

Tive medo que sentisse vergonha de si ... ou e mim, não sei.

Hoje o Paulo é um sem-abrigo e já não tem a mesma idade que eu.


 
Entre Estranhos



Um filme que conta com a interpretação de Mira Sorvino, Sophia Loren, Gerard Depardieu, Deborah Unger, Pete Postlethwaite.
Conta-nos a história de três mulheres, a sua vida com os seus fantasmas, os homens das suas vidas. Histórias dramáticas, que visam a intimidade feminina das personagens. Não é espectacular, mas vê-se muito bem.

 
Avós

Há avós que pedem, enrodilhadas, no metro,
apertamos os sobretudos, criminosos felizes.

Pedro Mexia