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2004-04-15

 

Erros que (não) prejudicam a compreensão


Pergunta:
Porque compreendemos palavras ditas com modificações sofridas na boca dos falantes? Há muitas modificações sofridas pelas palavras na boca dos falantes. Porque não há prejuízo na comunicação? Porque a compreensão das palavras mencionadas não é prejudicada?

Resposta:
Antes de mais nada, importa distinguir entre as palavras que são «mal ditas» por engano e as que são «mal ditas» por desconhecimento da forma correcta. Nem uma nem outra, se não produzidas de modo radicalmente diferente da forma correcta, impedem a comunicação porque o contexto, bem como a expectativa de quem ouve, contribuem largamente para que o entendimento não seja perturbado.
Por exemplo, se disser a outra pessoa «O preço da zagolina está uma locura!», mesmo que não emende, essa pessoa vai compreender que o que queria dizer, na verdade, era «O preço da gasolina está uma loucura!».
Da mesma forma, se ouvir alguém dizer «Ouvistes o que disse o locutor na televisão?», vai saber que o que a pessoa devia ter dito era «Ouviste o que disse o locutor na televisão?».
Se ouvir dizer ainda, num falante da sua variedade do Português, «As minha mão está(ão) suja(s)», mesmo que não concorde com esta construção, sabe que o que o seu interlocutor quer dizer é «As minhas mãos estão sujas».
Este tipo de lapsos (uns feitos conscientemente, outros não), que não impedem a comunicação e o entendimento da língua, só abona em favor da tese da Gramática Universal: todos os seres humanos são dotados de um mecanismo inato, que lhes permite compreender e produzir enunciados linguísticos, desde que submetidos a um estímulo desse género.
Esse tipo de erros não são, portanto, relevantes do ponto de vista lingu(ü)ístico que impeçam a compreensão, para quem fala e para quem ouve. Mas se pensar num exemplo que implica um processo importante e que é a ordem dos constituintes na frase, já podemos dizer que, uma vez invertida essa ordem, a comunicação e o entendimento podem ser prejudicados: «Comido o bolo o João tinha ontem, estivesse de dieta se não».
Há, portanto, uma hierarquia do tipo de erros produzidos pelos falantes: uns, menos relevantes, que não impedem a comunicação; e outros, mais importantes, que prejudicam a compreensão.

Susana Correia em http://ciberduvidas.sapo.pt

Comments:
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