2004-06-01
Foto de Alcino Viana
Olho para dentro dos olhos de uma criança e vejo o que devia: transparência, um riso cristalino, uma bola a rodar e a subir até ao céu num golo celeste.
Vejo franqueza. Vejo lápis de todas as cores, um sol amarelo a sorrir e uma casa com uma chaminé a deitar fumo que não polui ainda que saia do papel para a mesa.
Vejo dois joelhos pretos, sujos de roçar o chão e a rimar com a mancha de chocolate na camisola - nódoas de felicidade.
Mas sei de outras crianças que habitualmente não vejo, que habitualmente não vemos, que habitualmente ninguém vê, e que trazem sombras no olhar.
Sombras de fome e de guerra. Trazem o pó de vidas destruídas em nuvens que encobrem o brilho do olhar. E era bom, era tão bom, que nem que fosse este dia, nem que fosse neste único dia, nem que fosse uma única vez por ano, elas pudessem mesmo ser crianças.