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2005-08-04

 

Packs de Verão

Ela: biquíni (reduzido e com a peça superior intermitente), batik (aquele pano oriental, vendido nas tendinhas, que já fez moda), protector solar, toalha com ondas, óculos de sol (modelo oficial das stars), revistas dos famosos e de tricas e enredos, maço de cigarros e, claro, telemóvel.
Ele: calções (a dar pelos joelhos, sem marca visível), t-shirt às riscas, óculos de sol (tipo anos sessenta), toalha com âncoras, jornais desportivos (se a bola deixar espaço para outras modalidades), chaves do carro e, claro, telemóvel.
Eis os packs deste verão. Simples, próprios para estar e passear na praia, sem grandes danos em caso de um, quase impossível, roubo individual ou por arrastão de gente de um qualquer getto mal afamado. Porque quando se passeia, leva-se os óculos, as chaves do carro e os telemóveis. E a roupa?... Se ela for de seios à mostra e ele com os cabelos do peito à brisa, qual o problema? O carro ficou a poucos metros da praia, por isso é que ele andou às voltas durante mais de uma hora...
E há convívio familiar mais profícuo que um casal que em vez de destilar o fel de uma noite encurtada, pela música espanta-esqueletos de uma boîte em Albufeira, se concentra pacificamente numa leitura elevada, absorvendo cultura, como a pele os raios de sol? Há conversa mais interessante com os amigos do que, exibindo o último modelo de telemóvel anunciado, saber das fofocas fresquinhas, tecidas nas últimas horas da manhã, sentindo os salpicos das ondas e o rumorejar de centenas de banhistas apinhados, disputando uns palmos de areia?
Claro que não. A praia, o sol, o descanso, são pretextos. As férias não são necessariamente um retiro. São, antes, uma espécie de sublimação, em traje de passeio. Por isso não têm uma grande diferença da realidade quotidiana. Apenas se mudam uns quantos elementos, como seja o local e a vestimenta. O resto fica quase igual. Cozinha-se na casa arrendada, tal como na de residência. Chateiam-se, como normalmente. Buzinam nas filas de trânsito, como é usual. Encaram as do pão, do supermercado, do restaurante (então a do frango assado para fora bate todos os recordes...), como as bichas normais que enfrentam todos os dias.
Mas há diferenças, claro. Há, pelo menos, os Vips da Praia dos Tomates ou de outras, que esta anda a perder clientela. Há, também, os passeios, após o jantar, pela Marina de Vilamoura, onde, sem muita procura, se podem encontrar alguns jogadores de futebol e outros astros do desporto rei – basta ir ao bar certo, aquele que todos conhecem da televisão. Afinal, com um pouco de cultura, absorvida das revistas cor-de-rosa, qualquer pessoa pode dedicar-se ao interessante passatempo de papparazi amador.
Fica, porém, a ideia de que muita desta gente quebrou a barreira da sobrevivência, ao passar o cheque pelo arrendamento de uma semana ou, coroa de glória, por quinze dias em terras de mouros, onde se come mal e se é pior recebido. Mas há fotos, vídeos, lembranças para mostrar aos amigos, sobretudo aos que possam morrer de inveja por não terem a mesma sorte – capacidade de endividamento, entenda-se.
Nabos. Ali, em Espanha, tão perto, é mais barato. Ah, mas são nacionalistas. Viva! Tadinhos... É destes que eu gosto, porque também sou um deles. Ninguém me tira esta confusão do mês e Agosto no Algarve. Acabo as férias mais cansado, mas mais cioso do cumprimento dos meus deveres de cidadão. É assim mesmo. Mais cansado, mas mais português. Até vi uns ministros, cujos nomes não recordo. Mas eram ministros, disso tenho certeza. E então ter estado mesmo ao lado de duas figuras bem conhecidas de um canal de televisão, que não identifico porque ainda não me pagam a publicidade, foram os momentos mais especiais e inesquecíveis de toda a minha vida. Sei quem vai ficar roído de inveja, olá se vai...
Cansado, mais desgastado do que antes, pronto para ir repousar no doce lar, bendigo as férias que me proporcionam estas emoções únicas. Sim, porque já nem ver um batik levantado pela aragem do fim da tarde em plena avenida marginal de Quarteira desencadeia sensações tão fortes. Mesmo que por debaixo não exista mais nada... Mas isso é vulgar, não é? Ai, ai...

Vilamoura, 20.08.2002


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