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2006-07-11

 
Voyeur especializado

Quando ele entrava no escritório onde trabalhava, todas as suas colegas levavam a mão ao decote. Instintivamente.

Por mais que ele tentasse disfarçar, já todas lhe conhecia o vício. O seu olhar percorria demoradamente os decotes, verificando quais aqueles que, em miradas furtivas ao longo do dia, lhe poderiam servir de inspiração. Talvez por isso, e mesmo em dias de maior canícula, as colegas acabaram por subir os tecidos e pouco mais que os pescoços passaram a estar visíveis. Mas o que é que ele podia fazer, era mais forte do que ele, como ele próprio dizia, era um amigo dos decotes alheios.

Talvez por isso ele gostava tanto de andar de transportes públicos. Um mar de decotes a entrar e a sair em cada estação de metro ou paragem de autocarro. No entanto, se num desses apertos o seu braço tocava, ainda que ao de leve, um peito decotado, todo ele se desfazia em desculpas mesmo quando, o que acontecia quase sempre, nem a mais maldosa das almas pudesse imputar-lhe qualquer responsabilidade pelo sucedido.

Um dia perguntei-lhe à queima roupa, ao vê-lo rodopiar para garantir a inexistência de contacto. Como é que alguém tão obcecado por decotes pode ser tão avesso ao contacto fortuito das horas de ponta ?

Que é que queres Pedro, respondeu-me com o seu sorriso meio triste, eu não sou um tarado, sou apenas um voyeur especializado.

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