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2007-01-16

 
Joana

Naquele dia Joana chega à escola com os olhos vermelhos e a boca cerrada. Em vão os colegas lhe perguntam o que se passa, e é apenas depois das aulas, no caminho do costume que da sua boca saiem as palavras entaladas.

Quem as ouve é a sua amiga Catarina. – Contaste ao Rui ? Joana afunda a cabeça num não silencioso. Ainda não – diz – o que é que eu vou fazer, o meu pai vai-me matar.

De mãos dadas, ignorando piadas imbecis, as duas amigas vão à procura do Rui. A mão de Joana transfere-se de ninho e as lágrimas rebentam diques mal erguidos. Catarina retira-se, preocupada, sem saber como ajudar aqueles dois. Dezassete anos acabados de fazer. Catarina que tem dezoito e já é maior sabe bem como os dois se amam. Sabe também, pela amiga, do feitio do pai e do silêncio cabisbaixo da mãe.

Rui aperta a cabeça com as mãos. Pensa que não é possível, que tomaram todos os cuidados. Mas é o choro da Joana que faz dele um homem e o faz tomar uma decisão. Se ela concordar é claro.


NÃO

No dia combinado, olhos tristes e mão dada, chegam à morada combinada. O aspecto moribundo da casa e a cara da parteira que lhes abre a porta não lhe inspira confiança. Ainda pensa em dizer não, vamos embora, aqui não. Mas agora é Joana que tem o olhar firme – a decisão está tomada.

Dos dias que se seguiram, apenas ficou uma memória vaga, vermelha de sangue. Uma alucinação de sirenes de ambulância. A cara do Rui em permanência, a seu lado, no hospital. Mas ficou também uma outra marca, cravada no seu íntimo, a certeza que nunca mais irá poder ter filhos.


SIM

O que mais lhe custou foi arranjar coragem para ir à consulta. A simpatia da médica tornou tudo, depois, muito mais fácil. Engraçado é que a decisão estava mais que tomada: os dois queriam ter filhos, mas não agora. Nunca agora. O meu pai – pensava ela.

E no entanto, ao ouvirem os seus próprios argumentos, duvidaram pela primeira vez. A conversa com a Assistente Social também ajudou, principalmente porque ela, em momento algum, os pressionou.

A vida destes dois não foi fácil. Nunca é fácil. O Rui teve de arranjar emprego e ir estudar à noite e a Joana interrompeu os estudos durante dois anos. Mas hoje quando olham para o David, sabem que tomaram a decisão mais certa e como foi bom, e importante, poderem falar com alguém.

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